Juazeiro do Norte. Diante o quadro da falta água para consumo humano, animal e para irrigação e frente ao colapso hídrico generalizado, um pesquisador caririense desenvolveu um meio de tratar a água de barreiro para consumo humano e animal utilizando o mandacaru, planta nativa e que já é explorada pela indústria de cosméticos.
"É um trabalho que não onera o sertanejo. O tratamento possui custo zero e acessibilidade total. O processo é artesanal e 100% natural, realizado a partir do cerne do mandacaru", destaca Antônio Sávio Aires Furtado, graduado em Química pela Universidade Federal do Ceará (UFC) e especializado em tratamento de água e esgoto público, hospitalar e industrial. Segundo ele, "o objetivo da pesquisa foi desenvolver algo emergencial, que ajudasse o homem do campo a conviver de forma menos impactante com a seca".
Antônio Sávio lembra que a água de barreiro é a última alternativa hídrica para o sertanejo. "Trata-se de águas com uma elevada turbidez; com uma cor amarelada, provenientes de terrenos argilosos, ricos em ferro; e tem a presença de matéria orgânica, proveniente de contaminações trazidas pelos ventos e dejetos de animais. Mas, a partir desse tratamento, pode ficar apta ao consumo", explica.
Processo
O tratamento divide-se em dois procedimentos: para as águas que estão armazenadas por até dois anos (água barrenta nova), e àquelas de quatro a seis anos de armazenamento (água barrenta velha). A diferença entre elas é a quantidade de concentração de matéria orgânica. No primeiro cenário, coloca-se um litro de água do barreiro em um recipiente plástico transparente, tipo garrafa PET, corta-se um pedaço de aproximadamente 2,0g do cerne do mandacaru (adulto), em forma de cubo, fazendo cortes no sentido vertical e horizontal, até expor sua parte gelatinosa/pectinosa.
Em seguida, o cerne é inserido dentro da água e deixado em repouso por aproximadamente dez minutos. "Após este tempo, a garrafa é agitada manualmente com um bastão até notar a presença da formação de flocos graúdos na água. Deixe em repouso por aproximadamente cinco minutos até que ocorra a decantação dos flocos para o fundo do recipiente, tornado a água límpida e própria para os diversos usos", detalha. A operação de agitação pode ser realizada varias vezes até que se observe que a água esteja límpida.
Esse procedimento, segundo o pesquisador, pode ser ampliado para quantidades maiores, como para bombonas plásticas de 200 litros, tanques de alvenaria destinados e bebedouros de animais. No entanto, adverte que, se a água for destinada para potabilidade, como consumo humano, após o tratamento, deve-se colocar três gotas de hipoclorito de sódio (água sanitária), para cada litro, e esperar meia hora antes de usá-la, "tempo necessário para que ocorra a desinfecção total".
Já para a água barrenta mais velha, o tratamento ganha o auxílio de cal hidratada branca (hidróxido de cálcio) junto ao mandacaru. "Ao fim do tratamento, conseguimos uma água alcalinizada, com um pH em torno de 8,5 a 9,0, dentro dos parâmetros permitido pelo Ministério da Saúde", garante Sávio.
"O processo é semelhante ao anterior. A diferença está só na adição da cal. Dentro da PET, adiciona-se 1,0g a 2,0g de hidróxido de cálcio, agita moderadamente com um bastão por aproximadamente um minuto. Depois repete o mesmo processo anterior", acrescenta. Em ambos os processos, o tratamento da água deve ser realizado na sombra, protegido dos raios solares. Já o lodo, junto com os dejetos do mandacaru resultante do tratamento, que ficam decantados no fundo do recipiente, pode ser usado posteriormente como adubo orgânico.
Sem efeitos secundários
De acordo com o especialista, não há nenhuma evidência encontrada de que o mandacaru possa causar efeitos secundários nos seres humanos, especificamente com baixas doses usadas para o tratamento da água. "É um produto natural, com quantidades significativas de fibras, formadas por polímeros naturais de elevada massa molecular, como amido, hemicelulose, pectina e lignina", pontua, ao acrescentar que já está estudando uma forma de tratar a água do "volume morto de açude", por meio de polieletrólitos naturais extraídos da flora do Semiárido nordestino.
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