O presidente Michel Temer foi um dos responsáveis por assegurar que um aliado de Eduardo Cunha passasse a ocupar cargo estratégico na Caixa Econômica Federal e, assim, permitir que o ex-deputado levasse adiante esquema de recebimento de propina a partir de negócios do Fundo de Investimentos do FGTS (FI-FGTS). É o que garantiu o lobista Lúcio Funaro em depoimento prestado à Procuradoria-Geral da República (PGR) no dia 23 de agosto.
De acordo com a PGR, Fábio Cleto procurou Funaro em 2011 em busca de apoio para assumir uma vice-presidência na Caixa. O lobista teria então encaminhado o currículo de Cleto a Eduardo Cunha , que o remeteu a Henrique Eduardo Alves, então líder do PMDB na Câmara. As informações constam de documento sigiloso encaminhado em junho do ano passado pelo STF à 10ª Vara da Justiça Federal em Brasília, onde tramita a ação penal que investiga o esquema no FI-FGTS (veja mais sobre a ação penal ao fim desta reportagem).
De acordo com os termos de delação de Funaro, Henrique Alves repassou a indicação de Cleto à Casa Civil do governo mediante ao aval de Michel Temer , que teria assegurado esse cargo ao PMDB junto à então presidente Dilma Rousseff. Alguns dias mais tarde, Fábio Cleto foi efetivamente nomeado vice-presidente de Fundos de Governo e Loterias da Caixa.
Em seu novo posto no banco estatal, Cleto passou a ser o mais influente entre os 12 integrantes do comitê que decide sobre os investimentos do FI-FGTS, fundo voltado a financiar projetos de infraestrutura nos setores de rodovias, ferrovias, portos, aeroportos, hidrovias, saneamento e energia.
"Fábio Cleto poderia postergar a operação com um pedido de vistas, votar contra o projeto
e colocar os argumentos de forma a sensibilizar os outros conselheiros sobre riscos da operação, até mesmo porque vários conselheiros não eram do mercado financeiro, ao contrário dele, assim como argumentar favoravelmente às propostas", escreveu a Procuradoria-Geral da República no documento encaminhado ao STF.
"Nesse quadro, o voto de Fábio Cleto, embora fosse um entre 12, era importante, pois havia espaço nas reuniões para debates, argumentações e convencimento dos demais conselheiros, seja em um sentido seja em outro, especialmente porque era um técnico na área. E, na prática, foi isso que ocorreu", continua a PGR.
Cleto visitava Eduardo Cunha toda terça-feira para discutir esquema
Segundo a Procuradoria relatou ao Supremo, Cleto teria visitado Cunha em seu apartamento funcional tão logo ele assumiu a vice-presidência de Fundos e Loteria da Caixa. O peemedebista então teria "dito expressamente" que faria demandas ao executivo, ao qual "cabia analisar e encaminhar os projetos de acordo com seus interesses".
Em sua delação premiada, Cleto afirmou que ficou estabelecido que ele e Cunha passariam a se reunir semanalmente, sempre às 7h30 de terça-feira, para discutir os projetos discutidos no comitê de investimentos do FI-FGTS.
"Nas reuniões, Cleto passava a Eduardo Cunha todos os projetos que estavam em tramitação dentro da área do Fl-FGTS e da Carteira Administrada assim como o estágio em que se
encontravam. Cleto tinha acesso às informações porque recebia a pauta do que seria levado a votação com duas semanas de antecedência à reunião", relatou a PGR.
Tendo ciência dos projetos em discussão, Cunha e Lúcio Funaro decidiam qual a posição que Cleto deveria adotar na votação no comitê de investimentos. Por vezes, segundo a PGR, o deputado decidia imediatamente. Mas, em outras ocasiões, ele precisava "pesquisar" a empresa para depois pautar o vice-presidente de Fundos da Caixa.
Cleto confirmou em seu acordo de colaboração com a Justiça que recebeu propina das empresas cujos projetos Cunha ordenou que ele aprovasse no FI-FGTS.
Segundo Lúcio Funaro, "dificilmente a propina era maior que 3% sobre o valor da operação". O lobista afirmou ainda que era Cunha quem definia a divisão da propina e que ele, Funaro, sempre aceitava os percentuais definidos pelo deputado.
"Cabia a Lúcio Bolonha Funaro e a Eduardo Cunha solicitar e receber, para si e para outrem, direta e indiretamente, em razão da função de Eduardo Cunha e da de Fábio Cleto, vantagem indevida. A divisão dessa tarefa entre Cunha e Funaro dependia da proximidade com a empresa: o mais próximo solicitava e recebia a propina", apontou a PGR após ouvir Cleto.
Defesas
O advogado do presidente Michel Temer, que chegou a classificar a divulgação da delação de Funaro como "criminoso vazamento" , afirmou que as acusações do lobista são "vazias e sem fundamento". A defesa também afirma que os vídeos dos depoimentos de Funaro têm como objetivo constranger integrantes da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara que analisam a denúncia contra o presidente.
"Não se pode admitir o uso da palavra do confesso criminoso para influenciar os membros da Câmara, que votarão na CCJ o muito bem fundamentado parecer do deputado Bonifácio de Andrada, cuja conclusão é pela rejeição à solicitação de autorização para processar o presidente Temer", afirmou o advogado Eduardo Carnelós.
Já a defesa do ex-deputado Eduardo Cunha afirmou que Funaro "atribui a outros participação em atos criminosos cometidos por ele".
Operação Sépsis
Os desvios no Fundo de Investimentos do FGTS são investigados em ação penal da Operação Sépsis que tramita sob a cautela do juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara da Justiça Federal em Brasília. Além de Cunha, Cleto e Funaro, também são réus nesse processo o empresário Alexandre Margotto e o ex-presidente da Câmara Henrique Eduardo Alves.
Os interrogatórios dos investigados estão agendados para ocorrer entre os dias 25 e 26 deste mês. Preso em Brasília justamente para participar das audiências, Cunha deve retornar ao Complexo Médico Penal, em Curitiba, entre os dias 28 e 1º.
Eduardo Cunha é acusado de receber ao menos R$ 20 milhões em propina no esquema no FI-FGTS entre os anos de 2011 e 2015. São imputados a ele os crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e violação de sigilo funcional.
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